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UM CERTO RELÓGIO CARRILHÃO

(Yara Nazaré - 05/05/2002)

 

     Eis que janeiro chegou e com ele a viagem tão esperada de férias, rumo à fazenda Boqueirão, no sertão nordestino. Era meu lugar predileto para passar as férias, pois minhas primas de lá, eram muito legais! Tínhamos mais ou menos a mesma idade. Eu já estava com dez anos.
Dessa vez, encontrei uma novidade, um lindo relógio carrilhão, que meu "tio" João Adrião, mandara trazer de Lisboa e motivo de orgulho para ele. O relógio realmente, era muito bonito e marcava as horas tocando peças musicais, retinindo nas suas cordas. Minha tia colocou-o em lugar de destaque, preso na parede sobre um móvel antigo, logo embaixo da escada que dava acesso ao andar superior da casa, que era um sobrado, cujo piso superior era de tábuas de madeira corrida maciça, portanto não tinha laje de concreto.
Logo no primeiro dia, depois de tantas brincadeiras com as primas, chegou a hora de dormir. Antes fizemos a famosa ceia da noite, regada a mingáu de aveia, coalhada e outros quitutes.
O quarto de dormir das primas, ficava ao lado da escada, sobre a parede onde estava preso o relógio português. E, exatamente ao lado dessa parede, foi armada para mim, uma rede de linho, com as varandas em crochet, feita artesanalmente. Eu tinha muito medo de "alma do outro mundo", em virtude das histórias que ouvia outra tia minha, contar. Jamais teria coragem de levantar durante a noite para ir ao banheiro que ficava no andar de baixo do sobrado. E acredito que a explicação para o que ocorreu em seguida, reside nisto!
Quando o dia amanheceu, acordei lá pelas 06h00, percebendo o maior silêncio. Em fazenda acorda-se cedo para tomar leite mugido, tirado na hora pelo vaqueiro, no peito da vaca, com mel de abelha dentro do copo.
Bem, de repente, senti tudo frio em minha volta dentro da rede e senti uns arrepios e calafrios na barriga. Eu havia feito xixi e molhado meu pijama, a rede de linho e o lençol. E agora? Tímida e encabulada como eu era, o que fazer? Levantei-me, troquei de roupa, desatei a rede, enrolei-a junto com o lençol e o pijama molhado e fui descendo os degraus da escada lentamente e com cuidado para não fazer barulho.
De repente, desejei ser uma "alma do outro mundo" ou um pássaro para poder voar e sumir em um estalo. Ao pé da escada, estavam as primas, os primos, os tios e as criadas, rindo muito e apontando para a "obra de arte" que eu fizera! Inaugurei o famoso relógio lisboense, com o meu xixi que vazou por entre as tábuas de madeira, do piso superior, do quarto de dormir! Que vergonha passei e jamais esqueci.
 Mas, o tempo passa... e em 1999, já morando em Brasília, fomos de férias para Fortaleza-CE. Lá, fomos convidados para jantar na casa de uma das primas da fazenda Boqueirão, que depois de casada, foi residir na capital cearense.  Quando chegamos, foi aquela alegria. Relembramos os alegres momentos da nossa infância passados na fazenda dos pais dela, das brincadeiras de casinha, das histórias contadas sob a sombra das árvores, dos famosos banhos no açude. Em seguida, a prima avisou-me que tinha uma surpresa para mim e levou-me para outra sala da casa. Apontou para uma parede e lá estava ele, o famoso relógio lisboense que havia sido inaugurado, regado com o meu xixi!
Rimos todos mas, confesso, fiquei novamente muito encabulada
e minha prima sugeriu a foto que mostro a seguir!

 


(Eu, ao lado do famoso relógio lisboense, em Fortaleza/Ce)



Obrigada, pela visita.
Yara Nazaré